quarta-feira, 5 de agosto de 2009

O restante do copo (a metade), tomou de um gole só. Era pinga. Pura. Gostava do cheiro dela, da arranhada na garganta, do calor que chegava no meio do peito e se alastrava pra todas extremidades do corpo. Pensava em uísque, mas tomava pinga. Porque o uísque não tinha o cheiro da pinga.
Com o copo na mão achava que seria mais poético se dentro houvesse uísque - mas e daí? - afinal não estava em Las Vegas numa roda de jogo, nem em Londres cansado de trabalhar. Estava ali, numa cidadezinha qualquer no interior do interior do Brasil. E não se cansava de não trabalhar.
No bar não tinha ninguém, fora o dono. Este, apoidado em um engradado de refrigerantes prestava atenção no radinho rouco com pedaços de fitas coloridas amarradas na antena. Olhava como se fosse tv e ali pudesse enxergar o apresentador: " Agora a mais tocada da semana..."
Então o que tomara a pinga de um só gole caminhou até a porta que já fora um dia vermelha. Pôs um pé e a cabeça para fora como se espiasse algo. Recuou um pouco e ficou olhando os carros que passavam. Tinha até carroça, porque a cidade era do interior do interior, o que significa pequena. As pessoas que passavam, como sempre sói fazer, tinham pena dele. Os misericordiosos: "Enchendo os cornos já a essa hora." "Como pode, não deve ter família." "Vagabundo."
Ele sentia o mesmo. Por elas. "Que vidinha." "Já até trabalharam? Acabei de acordar."
Lembrou dos grandes bêbados da história: Nero, Churchill, Hemingway, Garrincha, Baco. Lembrou até do Baco que não existira, mas que dá nome às coisas. Pensou que talvez, um dia, ainda fosse um desses grandes da história. Mas não ali, naquela cidadezinha pequena com pessoas pequenas que tinham misericórdia, no interior do interior do Brasil.
Chegou até o balcão e pediu outro copo. Enquanto o dono servia, ele declarou: "Ainda me mudo dessa cidade."

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